
Luciano Cherubini, no livro Terra adentro: do vale do Rio Serchio à Serra Gaúcha, realizou com
habilidade e agudeza a difícil tarefa de recontar a história de um personagem
desconhecido de nosso país. O Brasil, como sabemos, foi construído e formado por
uma infinidade de desconhecidos e investigar a trajetória de um estrangeiro,
nesse caso, que para cá imigrou é tarefa útil e necessária, pois o relato da
vida de um de nossos antepassados pode iluminar toda uma época que, distante no
tempo, corria o risco de perder a sua significação.
Jornalista de formação e com mais de vinte
anos de experiência na área, Luciano Cherubini nos conta, neste seu primeiro
livro, a vida de seu tataravô, Guliermo Narciso Cherubini ou Guglielmo
Cherubini, conforme a fonte que se consultar, que no Brasil adotou o nome de Guilherme.
Nascido a 27 de maio de 1854, em Dezza, um pequeno povoado localizado próximo à
província de Luca, na região italiana conhecida hoje como Toscana. No entanto,
em 1854 ainda não havia ocorrido a unificação do país. Acompanhado de amigos, ele
embarca no vapor Ville-de-Santos em Havre, na França, rumo ao Rio de Janeiro no
dia 2 de setembro de 1876. A viagem se realiza graças a uma política de
imigração do governo imperial brasileiro que incentivava a vinda de
estrangeiros.
Terra
adentro
é uma obra rica em documentos, reproduzindo fotografias, jornais e mapas que
auxiliam o leitor a desbravar as terras inóspitas do interior do Rio Grande do
Sul para onde Guilherme Cherubini seguiu acompanhado de dois amigos. A colônia
Dona Isabel, onde viveu naquele ano é hoje Bento Gonçalves. Em 1880 se casou
com Illuminata Eccel, italiana que emigrara com a família para o Brasil e vivia
no mesmo povoado gaúcho. Estar casado, na época, era uma condição para que
Guilherme pudesse comprar lotes de terra distribuídos pelo governo. Vizinha à Dona
Isabel estava a colônia Conde D’Eu que em 1900 se eleva à condição de
município, tornando-se Garibaldi. No ano seguinte, Guilherme Cherubini é eleito
conselheiro municipal de Garibaldi, cargo correspondente hoje ao de vereador,
ensina-nos Luciano em seu livro.
O contexto da Primeira República pode ter
trazido benefícios ao imigrante italiano e pode ajudar a compreender a
importância que ele possuiu na região. Num período que ficou conhecido pelo
voto de cabresto, marcado por eleições fraudulentas, atas falsas, e no qual os
resultados das eleições podiam ser alterados posteriormente por grupos poderosos
do país, é significativo observar que nas eleições de 1911 a casa de Guilherme
Cherubini aparece como endereço de uma das sessões eleitorais do município,
onde 50 pessoas deveriam depositar o voto. Antes, em 1907, como lemos no livro
de Luciano, Guilherme foi nomeado tenente do primeiro esquadrão da Guarda
Nacional.
Em Terra
adentro também se registra a passagem da família de Guilherme Cherubini por
Encantado (RS) e depois por Tangará (SC). Dentre os diversos descendentes
mencionados no livro, destaca-se o filho João e o seu neto Claudino Cherubini
que chegou criança a Tangará acompanhado do avô italiano. Guilherme faleceu
nesta pequena cidade, em 1944, aos 89 anos. O livro de Luciano Cherubini, nesse
sentido, também registra a continuidade da família de Guilherme que prossegue
viva, desdobrada em várias outras famílias, em diversas partes de nosso país
continental. Essas histórias, claro, poderão ser contadas em outros livros.
Marcos Vinícius Teixeira
Campo Grande (MS),
03/03/2025