Marcos Vinícius Teixeira
De 7 a 9 de maio de 2018 ocorreu em
Sabará, Minas Gerais, o 3º Ciclo de estudos sobre o escritor Aníbal Machado –
16ª Semana Nacional de Museus, organizado pelo Museu do Ouro e com apoio do
Ibram e do MinC. Fui convidado pela coordenadora do evento, Isabella Carvalho
de Menezes, para palestrar e participar dos três dias do evento, que foi um
momento importante não só para refletir sobre a obra do escritor sabarense como
para repensar a relação que o seu universo literário e artístico possui com a
cidade de Sabará onde nasceu. Toda a equipe do Museu do Ouro foi importante
para a realização do evento, dentre os quais é preciso registrar a participação
do diretor Ricardo Alfredo de Carvalho Rosa e da museóloga Andréia Figueredo.
Existe em Sabará um Clube de Leitura
chamado Iniciados de Aníbal, que vem, desde 2016, realizando encontros para
conversar sobre obras literárias, em especial as do escritor Aníbal Machado.
Durante o terceiro ciclo, participei de um de seus encontros, quando
conversamos sobre o conto “A morte da porta-estandarte” e sobre a obra como um
todo do escritor sabarense. Posso afirmar que há um grupo de pessoas na cidade
de Aníbal interessado em sua obra e disposto a manter vivos o seu
universo literário e a sua memória. Dentre os iniciados, estão pessoas de grande erudição como
a Profa. Monica Maria Granja Silva e o Prof. José Arcanjo Do Couto Bouzas.
Durante uma palestra, conversamos sobre
como a cidade histórica de Sabará e o escritor Aníbal Machado estão ligados. Apesar de o casarão onde o escritor nasceu ter deixado de existir, este sobrevive em sua
obra, em especial no romance João Ternura
e nas diversas anotações que fez. Não é só o casarão, mas toda a chácara do Fogo
Apagou. O Rio das Velhas percorre boa parte de sua obra, aparecendo,
por exemplo, no belíssimo conto “Viagem aos seios de Duília”. Sabará aparece como a cidade colonial, pontilhada de igrejas. O som do sino percorre a região levado
pelo vento.
Palestra sobre a importância de Aníbal Machado na Literatura Brasileira 07/05/2018 - Sabará-MG |
Sabará são duas: a cidade real,
interessantíssima, que o turista descobre caminhando por suas ladeiras e a
cidade imaginária, ligada ao inconsciente coletivo, presente simbolicamente na
obra de escritores como Aníbal Machado, Paulo Machado e Lúcia Machado de Almeida.
Trata-se de uma importante família de escritores nascida em Sabará que
contribuiu para a constituição desta cidade letrada. É preciso, porém, ajustar
as duas lentes e aproximar mais a cidade literária da cidade real. Sabará, além da cidade histórica, é
também o lugar onde o personagem João Ternura se aventura e começa a descobrir
o mundo. O Rio das Velhas, além de maior afluente do São Francisco, é também o rio do personagem José Maria e do próprio Aníbal Machado. Vários
projetos podem ser realizados, nesse sentido, em Sabará.
Em um momento
especial do encontro, realizamos uma pequena expedição por pontos importantes
da cidade, com paradas, explicações e rememorações sobre os lugares
significativos para a obra de Aníbal Machado, de sua família e para a memória
da comunidade. Estivemos no local onde passava os trilhos e onde existiu a
antiga estação de trem da EFCB. Lá ainda existe a parte do prédio onde
funcionou a oficina da estação, que bem poderia abrigar um memorial para
a família do escritor. Há também todo um espaço disponível que poderia abrigar
um monumento do escritor Aníbal Machado com uma vista especial
da cidade de Sabará. Tratam-se aqui de impressões e sugestões minhas. Os
sabarenses saberão escolher os melhores lugares, se as ideias se concretizarem
um dia. Por todo o percurso conversamos com pessoas da comunidade e ouvimos
relatos importantes sobre a cidade e sobre seus habitantes que valem um
documentário.
Com o auxílio de
dona Edna Lúcia Chagas e de dona Neuza Chagas, estivemos no local onde existiu
o casarão do Coronel Virgílio Machado. O relato das duas moradoras é muito
importante e merece também compor um documentário sobre a região. Elas viveram
na casa onde Aníbal Machado passou a infância e possuem lembranças saborosas da
casa e da região. Com elas descobrimos que a Chácara Fogo Apagou possuía um
tamanho maior do que imagináramos. Segundo elas, a chácara começava no encontro
das ruas Mário Machado com a Rua de Fundo, onde havia originalmente uma
porteira. Seguindo pela rua de baixo, vamos encontrar o local onde existiu o
casarão do Coronel Virgílio na região formada pelas ruas Mário Machado, José
Barnabé das Chagas e José Ribeiro do Carmo. Lá existe hoje outra construção,
onde funciona uma empresa, que substituiu o antigo casarão. Avistando esta
construção da parte de baixo, na esquina, vemos pilares de concreto que
sustentam um telhado de zinco. Ali, na linha desses pilares, segundo as
moradoras, começava o casarão, mas sua posição era virada para a cidade e de
uma das janelas se avistava facilmente a igreja São Francisco de Assis e de lá
lhes chegavam os sons dos sinos tal qual ocorrera com o escritor Aníbal Machado
há mais de um século. Seguindo à esquerda, pela rua José Ribeiro do Carmo,
vamos encontrar o local onde terminava, segundo elas, a chácara, localizado no
encontro desta rua com a Paracatu ou a pequena praça triangular que há ali.
Nosso percurso terminou na Capela de Sant’Ana, bonita construção com paredes
inacabadas que merece estar no trajeto de todos os turistas.Chácara do fogo apagou – Pintura de Francisco Rocha, datada 1927. Pertenceu a Maria Luíza Machado Gontijo, filha do escritor. Acervo de Escritores Mineiros – UFMG. |
Houve ainda oportunidade para conversar
com a equipe do Museu do Ouro acerca de diversas questões envolvendo a relação
entre a comunidade e o museu, a cidade como um museu vivo, marcado por
monumentos, mas também por ausências, que são importantes para a identidade do
sabarense. As várias possibilidades e realizações materiais e não materiais,
dentre inúmeras outras questões relacionadas à significação da região para a
comunidade. O ciclo como um todo pareceu servir antes de tudo para instigar em
nós e na comunidade as inúmeras possibilidades que a cidade, que é detentora de potencial incalculável, oferece.
Instigado pelas pessoas com quem convivi
e conversei durante os dias do evento, resolvi compartilhar algumas ideias que
podem ser transformadas em projetos para a cidade.
Projeto
01: Itinerário do inacabado
A
cidade de Sabará é rica em construções inacabadas e ruínas. A igreja Nossa
Senhora do Rosário, as ruínas do Solar Melo Viana, que atendendo a uma pesquisa
do Prof. José Bouzas poderá ter o nome alterado, a ponte da estrada de ferro, a
Capela de Sant’ana, que possui paredes inacabadas em seu interior, dentre
vários outros monumentos que podem ser acrescentados. Vale observar que o
inacabado e as ruínas são um tema caro à obra do escritor Aníbal Machado.
Tratei do assunto na minha tese Aníbal
Machado: um escritor em preparativos. O título poderia ainda ser outro:
Rota do inacabado, Roteiro do inacabado... O tema, que é importante em áreas como Literatura, Arquitetura, Museologia, Sociologia, Artes Plásticas, poderia instigar também a organização de um evento com palestras.
Projeto
02: Semana Aníbal Machado
Tal
como se deu no 3º Ciclo de estudos sobre
o escritor Aníbal Machado, a cidade de Sabará pode ter a sua Semana Aníbal
Machado, a ocorrer anualmente. Algo semelhante ocorre na cidade de Cordisburgo
com a Semana Rosiana. O evento em Sabará poderia contemplar a família de
escritores. Com isso, além do autor de João
Ternura, o evento seria uma oportunidade para conversar sobre a obra de
Lúcia Machado de Almeida, de Paulo Machado e de outros autores. Observe-se
nesse sentido que a literatura infantojuvenil teria lugar importante no evento,
que ainda poderia contar com obras de autores nascidos em outras cidades, mas
pertencentes à família, como Maria Clara Machado e Ângelo Machado. O Itinerário
do Inacabado poderia ocorrer como parte da Semana Aníbal Machado.
Projeto
03: Memorial Coronel Virgílio Machado
A
cidade de Sabará poderia ser presenteada com um espaço, uma casa, para se constituir
o Memorial Coronel Virgílio Machado, abrigando informações sobre toda a família
de escritores. Quadros poderiam ser confeccionados com as fotos existentes. As
primeiras edições das obras podem ser adquiridas e podem ser alocadas em
expositores. O espaço pode contar com salas para cursos e outros eventos.
Talvez algum mobiliário da família possa ser adquirido. O espaço pode e deve ser
escolhido pelos sabarenses. Faço uma sugestão: utilizar parte da antiga oficina
da primeira estação de trem. Refiro-me à parte direita do prédio, onde hoje
funciona a Secretaria Municipal de Saúde. Não entrei no prédio e não sei se
atualmente o espaço é utilizado. A localização deste prédio é interessante, pois de lá se tem uma vista da cidade semelhante à que o menino Aníbal Machado tinha da casa do pai.
Projeto
04: Monumento Aníbal Machado
Uma
estátua de Aníbal Machado poderia ser colocada em algum lugar da cidade de
Sabará. Sempre me lembro da caricatura do Aníbal segurando firme a sua obra João Ternura, que tardou a publicar e só foi editada postumamente. A imagem pode servir de inspiração. Talvez o escritor
segurando o livro ou, claro, outra ideia. A estátua do Aníbal Machado poderia ser
semelhante a estátuas recentemente instaladas em diversos lugares do país, como
a de Carlos Drummond de Andrade no Rio de Janeiro, a do próprio Drummond conversando com o Pedro Nava em
Belo Horizonte, a do Murilo Rubião caminhando também em Belo Horizonte, na Praça da Liberdade, ou, mais
recente, a de Manoel de Barros em Campo Grande-MS. Há uma árvore muito bonita
próxima ao prédio da atual Secretaria Municipal de Saúde. A árvore evocaria a
famosa cena do conto “Viagem aos seios de Duília”. Se este prédio fosse
utilizado para abrigar o Memorial Coronel Antônio Virgílio, o Monumento Aníbal
Machado poderia ficar perto ou debaixo da árvore frondosa que há ali. O entorno
poderia ser alterado e até mesmo uma praça aberta poderia ser construída no local.
Seria interessante a estátua ficar próximo ao memorial e poderia ficar
virada para a cidade. Ter-se-ia então uma vista correspondente à que Aníbal
Machado tinha do casarão de sua infância. No percurso da estátua até o
centro histórico passamos pelo Rio das Velhas, que tanto marcou a sua obra. A
região poderia ser revitalizada.
Projeto
05: Marcos históricos
Placas
com fragmentos de textos dos escritores da família Machado poderiam ser
espalhadas pela cidade, com o cuidado de não a tornar carregada demais de informações. Nesse sentido valeria a pena realizar um trabalho de diminuição
de elementos que há na cidade como as placas comerciais. Áreas de estacionamento merecem estudo e requalificação. Valeria a pena pensar em fechar uma pequena parte da cidade impedindo-se a passagem de qualquer tipo de carro. Claro que tudo precisa ser estudado e avaliado. Por isso, os fragmentos de textos poderiam ficar em lugares discretos e seriam descobertos
pelos visitantes em suas caminhadas. Não temos mais o casarão do Cel. Virgílio
Machado, mas valeria a pena termos um marco que registrasse que naquele local
existiu o casarão e a chácara. Sugiro que os nomes das ruas que cruzam atualmente a antiga
Chácara do Fogo Apagou fossem alterados, conservando-se, claro, os nomes que possuem significação para o lugar. Parece-me, por exemplo, que não há em Sabará as ruas
Cel. Virgílio Machado e Aníbal Machado. Assim, poderíamos ter ruas com nomes
dos escritores desta família nesta região. Isso ajudaria a manter uma
identidade para o lugar onde existiu a chácara. Sugestão de nomes: Rua Cel. Virgílio
Machado, para a rua mais importante em relação à localização do casarão; Rua Aníbal Machado; Rua Lúcia Machado de Almeida; Rua Paulo Machado, para as outras ruas. O
mapa a seguir auxilia na localização da antiga chácara.
Localização do casarão do Coronel Virgílio Machado |
10/05/2018
Outras fotos:
Marcos, pelo visto o evento que aconteceu em Sabará fez com que você adotasse essa cidade. Ao ler o seu texto, pude perceber o seu apreço por todos os envolvidos no evento e a sua enorme vontade de dar mais visibilidade a cidade.
ResponderExcluirEm seu texto há importantes ideias que futuramente, se forem concretizadas, Sabará será palco de tantos outros eventos tão significativos como esse "3° ciclo de estudos do escritor Anibal Machado".
Parabéns!
Abraços.
Prof. Marcos, estou deveras satisfeito pela leitura que realizei. Não participei do evento, mas ao ler o texto que elaborou senti-me como se estivesse lá. Parabéns, pelo texto. Sucesso em seu excelente profissionalismo..
ResponderExcluirAbraço.